Custos atrasam uso de tornozeleiras eletrônicas no Brasil


tornozeleiraDesde o início de julho, uma nova lei permite monitorar eletronicamente os criminosos que ainda aguardam julgamento no Brasil, em vez de mandá-los para a cadeia. Mas apesar de elogiada por especialistas, a regra ainda não “pegou” nem entre os Estados que já fiscalizavam os presos que cumprem pena em regime aberto ou semiaberto, ou que têm direito às cinco saídas temporárias anuais da prisão.
Um dos fatores é a falta de recursos para investir na tecnologia, já que a compra dos equipamentos não estava prevista nos orçamentos estaduais deste ano.
Embora deixe claro a responsabilidade do Poder Executivo, a lei das medidas cautelares não diz de onde deve sair o dinheiro para a implantação nos Estados, que agora quebram a cabeça para calcular se, afinal, vale a pena adotar a alternativa, como avalia Luciano Losekann, juiz auxiliar da presidência da CNJ (Conselho Nacional de Justiça).
- O legislador foi sábio ao criar essa lei, mas, por outro lado, faltou deixar claro como deve ser a criação da estrutura de fiscalização [das medidas cautelares] e de onde devem sair os recursos que serão utilizados. Ou seja, ela deu a via, mas não deu, até o momento, as condições fáticas para que os poderes Executivos dos Estados a coloquem em prática. Vai levar um tempo ainda.
Segundo o CNJ, até fevereiro, ao menos cinco Estados já haviam implantado as tornozeleiras para fiscalizar presos condenados, atendendo a uma legislação do ano passado (a lei das execuções penais): São Paulo, Rio Grande do Sul, Rio de Janeiro, Rondônia e Mato Grosso do Sul. Destes, nenhum ainda tem previsão para começar a usar a medida com presos provisórios, segundo levantamento feito pelo R7.
Os preços “salgados” fizeram o Rio Grande do Sul cancelar uma licitação em maio deste ano. De acordo com a Susepe (Superintendência de Serviços Penitenciários), cada equipamento sairia R$ 500, mas o governo pretende pagar até R$ 300 por tornozeleira.
Agora, o Estado (que usou o mecanismo em caráter experimental por seis meses) abriu um nova licitação para implantar 4.000 unidades até 2014, mas ainda não decidiu quantos destes aparelhos devem ser destinados a presos provisórios – inicialmente, a medida valerá para presos sentenciados.
Sem prazo para tornozeleira
Em São Paulo, onde 4.800 pessoas são monitoradas, foi criado neste mês um grupo de estudos para analisar como será a adoção da medida entre presos provisórios. Somente após a conclusão dos trabalhos, ao final de setembro, é que a SSP (Secretaria de Segurança Pública) deve decidir se abre licitação para expandir o uso de tornozeleiras.
Já no Rio de Janeiro, onde 311 pessoas estão sob vigilância eletrônica, não há uma previsão para adquirir mais equipamentos, segundo a Seap (Secretaria de Estado de Administração Penitenciária). No Estado, além da questão financeira, a eficácia da tecnologia colocou em dúvida a expansão do programa e, em abril, o TJ (Tribunal de Justiça) determinou a suspensão do uso das tornozeleiras entre 1.500 presos do regime semiaberto – o índice de fuga, na ocasião, foi de 3,8%.
O governo de Mato Grosso do Sul, por sua vez, aprovou o uso das tornozeleiras em regime experimental, mas não deve abrir licitação até que o Depen (Departamento Penitenciário Nacional) ajude com os custos da implantação, informou a secretaria da Sejusp (Secretaria de Estado de Justiça e Segurança Pública).
Em Rondônia, onde 62 presos “voluntários” usam tornozeleiras em caráter experimental, a ideia é adquirir 600 unidades até o fim do ano, que devem ser destinados apenas aos detentos já sentenciados. Entretanto, ainda não foi aberto processo de licitação.
Sem os equipamentos, a Justiça tem evitado recomendar a aplicação do recurso, por enquanto. De acordo com juiz corregedor do Dipo (Departamento de Inquéritos Policiais), de São Paulo, Alex Zilenovski, todos os nove juízes do departamento já chegaram a pedir a monitoração eletrônica em ao menos um caso mas, diante da notícia de que o sistema ainda não foi implantado, recuaram e aplicaram outras medidas cautelares (veja abaixo as alterativas).
Mesmo assim, Zilenovski vê com otimismo a lei e diz acreditar que trata-se apenas de uma “fase de transição”, comum quando novas leis são criadas.
- [A monitoração eletrônica] É uma solução boa, porque o espírito da lei é justamente criar mecanismos para fiscalizar o sujeito, sem que ele tenha de ir para a prisão. E, nesse caso, é a tecnologia ajudando na fiscalização. Mas tudo leva tempo.
Vale a pena?
Em tese, deixar a pessoa livre e monitorá-la eletronicamente sai bem mais em conta que mantê-la presa. Uma tornozeleira custa, em média, entre R$ 500 e R$ 800 por mês, dependendo da tecnologia adotada, enquanto um detento provoca um gasto mensal médio de R$ 1.800 aos cofres públicos.
Entretanto, os custos embutidos na implantação do sistema encarecem a adoção da tecnologia. Isso porque, além das tornozeleiras, é preciso implantar unidades de monitoração e treinar fiscais, que devem ficar de olho na movimentação dos criminosos 24 horas por dia.
Em São Paulo, primeiro Estado a adotar as tornozeleiras no país, a implantação do sistema para monitorar 4.800 presos custou cerca de R$ 50 milhões, para um pacote de serviços que inclui 30 meses de “aluguel” dos equipamentos, instalação da tecnologia e capacitação de agentes, de acordo com a SAP (Secretaria de Administração Penitenciária).
O valor é superior ao custo médio de construção de uma cadeia pública com capacidade para 800 presos, que sairia cerca de R$ 32 milhões.
Mas, considerando somente a contratação de funcionários, por exemplo, a medida ainda é considerada relativamente econômica – apesar de não ser tão barata. De acordo a Spacecom (empresa que integra o consórcio SDS, que fornece os serviços ao Estado de São Paulo), é preciso apenas um agente para monitorar 200 pessoas sob vigilância – na prisão, a recomendação do governo federal é contratar um agente para cada cinco presos, segundo o Ministério da Justiça.
Vale lembrar ainda que o objetivo da lei é ressocializar os infratores que, embora tenham cometido crimes, não necessariamente precisariam ir para a prisão, destacam os juízes ouvidos pelo R7. Nesse sentido, a expectativa é que, apesar da demora, a monitoração eletrônica “pegue” em todo o país em longo prazo.
R7